Em seu perfil no Instagram, Alexandre Tchaca Tchaca se apresenta aos mais de 24 mil seguidores como “pai de três filhos”, “servidor público” e “filho de comunidade carente”. As descrições mostram um homem comum, mas ocultam outro lado dessa biografia. Ele está sendo citado como personagem em um dos principais casos da crônica policial baiana dos últimos anos: o chamado Caso Cabula. Tchaca Tchaca, ou melhor, Lázaro Alexandre Pereira de Andrade, é um dos 9 policiais militares réus pela morte de 12 jovens na madrugada de 6 de fevereiro de 2015, na Vila Moisés, em Salvador. Em 2020, cinco anos após o episódio, ainda não solucionado, o PM resolveu fazer uma incursão na política e é candidato a vereador da capital baiana pelo Patriota.
Apesar do processo, a legislação não impede pessoas investigadas ou réus de concorrerem ao cargo. A Lei da Ficha Limpa veta apenas candidatos com condenação em segunda instância, o que não é o caso dele. A ação penal sobre o Caso Cabula tramita na primeira instância do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), sem decisão de mérito.
Tchaca Tchaca também é investigado por envolvimento em outros casos de mortes decorrentes de intervenção policial, ou seja, no exercício da função. Ele é citado, junto a outros colegas de corporação, em pelo menos sete inquéritos abertos pelo Ministério Público da Bahia (MP-BA) para apurar ocorrências do tipo entre 2018 e 2020, todos abertos após o episódio no Cabula. Há ainda outro procedimento instaurado neste ano, no qual o PM licenciado é alvo de investigação por lesão corporal grave.
Das sete investigações por homicídios decorrentes de intervenções policiais, em pelo menos quatro, o MP-BA pediu à Polícia Civil abertura de inquéritos próprios sobre os casos, segundo levantamento feito pelo Bahia Notícias junto à assessoria de comunicação do órgão. Vale destacar que todos os procedimentos citados estão em andamento, sem nenhum tipo de conclusão por parte do Ministério Público.
A Justiça arquivou outros dois inquéritos em que ele era investigado. Um apurava a morte de Wallace Paixão dos Santos, em 22 de outubro de 2018, durante operação. O outro, pelos homicídios de Derivaldo Dias dos Reis e Diogo de Santana Silva, em 28 de janeiro de 2019, também em serviço. Nas duas situações, a Justiça entendeu que Lázaro e os demais colegas agiram em legítima defesa.
No mais rumoroso caso ao qual responde judicialmente, o do Cabula, Tchaca Tchaca chegou a ser absolvido sumariamente junto aos outros 11 PMs, em decisão considerada relâmpago pela celeridade incomum para os padrões da Justiça brasileira e baiana com a qual foi tomada – um mês após a aceitação da denúncia do Ministério Público.
A sentença, no entanto, foi anulada pela Primeira Turma da Primeira Câmara Criminal do TJ-BA em setembro de 2018. Na ótica dos desembargadores, foram encontradas diversas nulidades na decisão, da juíza Marivalda Moutinho. Atualmente, a mesma magistrada é ré na Operação Faroeste, que investiga esquema de compra de sentenças no Tribunal. Com a anulação, o processo do Cabula voltou para a primeira instância. A última movimentação judicial pública no caso ocorreu em fevereiro deste ano. O processo está sob relatoria do juiz Vilebaldo José de Freitas Ferreira, do 1º Juízo da 2ª Vara do Tribunal de Justiça, e corre em segredo de Justiça.
Para concluir que o PM era realmente o investigado nos procedimentos mencionados, a reportagem cruzou números de RG e CPF apresentados por ele no DivulgaCand, sistema do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que aglutina informações sobre candidatos, com os de documentos de identificação contidos em alguns dos processos nos quais eles figura. Os dados correspondem à identificação de Lázaro. As informações usadas neste levantamento são públicas.
Ao BN, Alexandre Tchaca Tchaca afirmou que, com base na Lei da Ficha Limpa, a candidatura dele foi autorizada e homologada pela Justiça Eleitoral, “não tendo nenhuma acusação ao meu desfavor, fundo de verdade ou alguma decisão condenatória”. Ele declarou também que seu papel enquanto pré-candidato é trabalhar para que o reflexo da violência e falta de estrutura nas comunidades carentes de Salvador sejam “ao máximo minimizadas”.
Presidente do Patriota em Salvador, Jean Sacramento disse desconhecer a participação do candidato no Caso Cabula. Mas defendeu que ele esteja no pleito eleitoral e ponderou não haver decisão condenatória contra o correligionário. “Até que se prove o contrário, ele é inocente. E ele é um soldado. Se ele estava em alguma ação, ele tinha um comandante. Acima dele tem um comandante, que comandou a ação. E, acima dele, tem o governador, que apoiou a ação. Não vou condená-lo, já que a Justiça não condenou”, declarou Sacramento, que acrescentou recriminar “qualquer tipo de chacina” e que “ninguém tem direito de tirar a vida de ninguém”.
Tchaca Tchaca em foto com o candidato a prefeito de Salvador Bruno Reis (DEM) | Foto: Reprodução/Instagram
LIDERANÇA COMUNITÁRIA
Nas redes sociais, o lado soldado da PM de Lázaro Alexandre dá lugar ao líder comunitário Tchaca Tchaca. Em postagens, ele ostenta ações feitas no Bairro da Paz, de onde é originário, segundo Jean Sacramento. Trabalhou, por exemplo, na organização da Lavagem da localidade, que teve “O Poeta” como uma das atrações. Também organiza arrecadações e entrega de alimentos para a comunidade.
Nos últimos meses, vem divulgando fotos e vídeos de apoiadores de sua candidatura. Em uma das imagens, figura uma liderança política conhecida na cidade: o candidato à prefeitura Bruno Reis (DEM). É que o Patriota, partido de Tchaca Tchaca, apoia o democrata.
Fonte: Bahia Notícias